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“São tantas emoções...” que precisamos falar delas!

Atualizado: 23 de ago. de 2021

Crianças e adolescentes têm suas emoções, e conversar sobre isso pode ajudá-las no processo de identificar e sentir cada uma de maneira saudável



Espernear no chão por um brinquedo que lhe foi tirado, ter um acesso de choro porque ouviu um não, bater no amigo que não quis brincar com ele, puxar o cabelo da irmã mais nova que está no colo da mãe, ficar nervoso porque não entendeu a explicação da professora, irritado porque cometeu erros na lição ou tirou nota baixa na prova. Todas essas são atitudes que podem acontecer em crianças e adolescentes, que costumamos corrigir, mas muitas vezes sem nos darmos conta de algo importante: podem ser apenas sintomas, frutos de algo mais profundo, uma emoção ou sentimento que, por não saberem explicar ou administrar, se transformam em uma ação que chame a atenção e também uma maneira de extravasamento.

A solução para isso: conversar sobre as emoções. Todas, de todos os tipos, em todos os momentos que haja espaço para isso. Nem sempre vai ser fácil, muitas vezes eles não vão querer nos ouvir e em outras nós é que vamos nos sentir desconfortáveis, porque, afinal, falar de emoções envolve falar de nossos sentimentos, acessar nossa subjetividade, intimidade – e nós também “aprendemos” a escondê-los. Mas, acredite, essa atitude é muito importante para criar pessoas mais preparadas para enfrentar desafios e serem adultos emocionalmente inteligentes. E quanto antes começar a traçar esse caminho, melhor.


A falta que cria mais falta


Podemos não perceber, mas desde bem pequenos o ser humano já demonstra emoções. Mais que isso, começa também a identificar as suas emoções em reação às emoções daqueles que os cuida, criando, assim um repertório interno de “como sentir e o que fazer com isso”. A criança, quanto mais se relaciona com pessoas, sejam adultos ou outras crianças, mais aprende e armazena dados sobre o sentir. A questão é que estamos acostumados a sentir muito, mas falar pouco ou nada sobre esse assunto, e a falta de informações pode trazer confusões. No ambiente escolar e nas disciplinas tradicionais da grade curricular ainda se aborda pouco sobre esse assunto, seja no ensino de estratégias de como lidar com emoções como no desenvolvimento de habilidades como empatia, acolhimento, escuta ativa, entre outros. Apenas ser capaz de falar, soletrar ou escrever, por exemplo, a palavra “raiva” não significa que a criança saberá controlá-la.


Ou seja, a falta de ensinamento cria uma falta de conhecimento do que significa sentir. Por isso é papel dos pais e cuidadores sensibilizar e ajudar os filhos a identificar, nomear, interpretar e usar suas emoções. Como diz o terapeuta comportamental americano Jaime Gleicher, “se você apenas disser ao seu filho para ir para o quarto quando ele se comporta mal, estará perdendo uma oportunidade de discutir por que ele agiu daquela forma e ajuda-lo a entender como pode estar se sentindo”. São pequenos gestos assim que podem abrir as portas da comunicação para ajudar seu filho a entender as complexidades das emoções. Pequenos, mas não necessariamente fáceis se nunca foram praticados...


Pequenas mudanças, grandes emoções


O objetivo dos sentimentos é entender o que está acontecendo dentro de nós e ao nosso redor, com base em nossas experiências passadas. Por isso é que, para falar de emoções, é preciso... saber falar de emoções. O que significa que não há escapatória: temos que começar por nós mesmos. Falar de emoções com crianças e adolescentes tem a ver, em primeiro lugar, com a disposição em ouvir, estar sensível, atento ao que eles demonstram, seja na fala, nas atitudes ou mesmo por um desenho; e, então, depois de ouvir, precisamos abrir espaço para que eles expressem essas emoções sem medo de julgamento, vergonha ou timidez.


Quanto mais seguro e à vontade seu filho se sentir com você e no ambiente, mais fácil será para ele abordar esses assuntos ou mesmo trazer alguma emoção ou sentimento à tona em situações específicas que o deixaram feliz, triste, com raiva e por aí vai. E não há melhor forma de criar essa intimidade e segurança do que se abrindo também. Aqui em casa, por exemplo, conversamos muito a partir de situações e experiências reais do nosso dia a dia, as boas e as ruins, as que nos alegraram e as que nos deixaram desconfortáveis.


Dentro disso, muitas vezes como mãe sinto que preciso pedir desculpas, por ter passado do ponto na braveza, na rigidez etc., e faço isso aproveitando para compartilhar com meus filhos as minhas próprias dificuldades, frustações e emoções. E quando faço isso, inevitavelmente percebo que o acolhimento e a parceria afloram, meus filhos me entendem, se abrem também e passam até a cooperar mais.


Faça o que eu digo...


... não é algo que adianta com os pequenos. Eles aprendem majoritariamente pelo exemplo, o que significa que muitas das reações e sentimentos dos seus filhos são, na verdade, um reflexo das suas e dos outros adultos com quem se relacionam. Tanto para o bem quanto para o mal, de ter cuidado com nosso parceiro quando está tendo um dia difícil a ficar muito bravo quando acontece algo simples como quebrar um copo. Eles veem, e aprendem, e imitam, ainda que inconscientemente. Somos referência, e por isso é tão importante falar sobre essas emoções, porque nem sempre teremos autocontrole suficiente para lidarmos com elas exatamente como gostaríamos (somos pais, não super-heróis), e saber de nossas tentativas, ainda que frustradas, os ajuda a olhar para nós como seres humanos reais, imperfeitos e dispostos a melhorar, fazendo com que, advinha?... Eles sigam o exemplo e façam o mesmo.


Claro que com as crianças pequenas nem sempre é possível abrir-se e falar dos problemas e questões da vida adulta, mas ainda assim podemos explicar quando estivermos com raiva, descrevendo o que estamos sentindo ao pegar um tráfego grande antes de um compromisso importante, por exemplo, e falando sobre como lidamos com esse sentimento:


“Filho, estou me sentindo muito frustrada por estar atrasada, e me dá raiva ver que todo esse trânsito vai me fazer chegar ainda mais tarde. Quando me sinto assim, fico até com mais calor, e sinto que poderia gritar e ficar brava com alguém, mas tento me controlar para não fazer isso. Sinto muito se não pareço uma mamãe muito feliz agora, mas estou conversando com a minha raiva enquanto ela não vai embora, e me concentrando em dirigir bem para diminuir o atraso. Preciso de um tempo, tudo bem?”


Esse é só um exemplo de fala que ajuda a conectar seu filho com a emoção em situações em que ele sinta o mesmo. Isso não vai resolver de imediato, claro, mas com o tempo certamente ajudará a conter os dramas. Enquanto isso não acontece...


Cuidado com o que diz


“Engole esse choro.”

“Não é razão suficiente para ficar triste.”

“Que feio ficar bravo assim.”

“Não precisa ter ciúmes.”


São frases aparentemente inocentes, que muitos de nós, hoje adultos, ouvimos em nossa infância, e às vezes acabamos repetindo aos nossos filhos automaticamente – e justamente devido às nossas experiências passadas. Mas de inocentes elas não têm nada, e, ainda que você não perceba isso em si mesmo, essas falas podem ter sido responsáveis por importantes posturas e comportamentos que você demonstra hoje, incluindo não saber se abrir ou não ter autocontrole ou inteligência emocional para lidar com situações desafiadoras. Portanto, evite ou, melhor ainda, corte do seu diálogo essas e quaisquer outras frases que diminuem ou inibem os sentimentos dos pequenos.


Em lugar delas, escolha frases de acolhimento, que demonstram que você entende sua tristeza/raiva/frustração, ainda que não concorde com ela, porque afinal de contas cada um sente o que sente. “Entendo sua frustração”, “sinto muito que esteja se sentindo tão triste”, “percebo que você está mesmo bravo” ou “algumas coisas nos deixam com raiva mesmo” são alguns exemplos que vão ajudar a criança a, além de se sentir acolhida, aprender a dar nome aos sentimentos e saber identificá-los no futuro. Então, depois (e só depois!) de empatizar com o sentimento de sua criança, passe a explicar-lhe que há maneiras diversas e saudáveis para expressá-los, ensinando quais as mais corretas, que podem dar alívio aos sintomas, e quais as que podem trazer-lhe mais problemas e ainda afetar os outros.


Deixar sair é preciso


Claro que como pai, mãe ou responsável você não vai deixar seu filho bater em outras crianças, quebrar coisas ou gritar em lugares onde é preciso fazer silêncio somente para expressar suas emoções. Mas há um meio termo entre essa permissividade nada educativa e o igualmente danoso “engole o choro”. Até porque, conversar sobre as emoções mas não deixar que elas “apareçam” na hora que chegam seria contraditório e não ajuda no processo de aceitar que é normal e saudável sentir, e que não há sentimentos que são “bons” ou “maus” são apenas nossos naquele momento.


“Todos os sentimentos são importantes e têm algo a nos dizer. A raiva, por exemplo, aparece quando algo não está legal ou quando estamos nos sentindo desrespeitados. A tristeza, por sua vez, traz certa introspecção, permitindo que nos acalmemos e voltemos nosso olhar para dentro de nós mesmos. O que pode ser negativo é o comportamento que temos diante de uma emoção, como bater quando estamos raivosos, mas nunca a emoção em si”, diz a especialista em disciplina positiva Clara Freitas, que dá uma dica de como ensinar que a criança pode expressar até a raiva de maneira saudável: “É inadmissível bater em alguém por estar brava, mas a criança pode dar um grito em uma almofada ou amassar uma folha de papel, por exemplo”.


Atenção, equilíbrio e criatividade


No caso de dúvida de como lidar com o tema, use essa pequena fórmula. A atenção, para perceber o momento em que surge a oportunidade de falar das emoções com o seu filho e escutá-lo verdadeiramente; o equilíbrio, para ensinar-lhe que é permitido sentir tudo e falar de tudo quando se faz da maneira certa e na hora adequada; e a criatividade para oferecer opções de como expressar os sentimentos e até mesmo nomeá-los. E, em todos esses casos, lembre-se: comece você mesmo dando o exemplo. Quando nos colocamos no mesmo nível de dignidade da criança, ela não apenas aprende pelo exemplo, mas também percebe que é igualmente capaz, criando autoconfiança e autonomia. Se você sente dificuldade de criar essa interação mais íntima e próxima de seus filhos e quer saber sobre meu trabalho de orientação familiar, clique aqui.


Para resumir, deixo uma lista de dicas práticas para ajudar os pequenos a falarem e lidarem bem com suas emoções:

· Conte histórias da sua infância e os sentimentos que você tinha com elas

· Ensine aos pequenos os nomes das emoções e o que elas significam, sem classificá-las como boas ou más

· Ajude-os a entender quais são suas preferências, seus desejos e suas necessidades

· Em situações do dia a dia, mostre que errar é normal e que está tudo bem se algo não der certo

· Peça desculpas quando se expressar de forma que não gostaria ou descontar em alguém de maneira inapropriada

· Parabenize seus filhos quando eles reconhecerem sentimentos de forma positiva

· Em caso de chilique, foque em conter a ação negativa, não a própria criança. Reprimir não é legal

· Seja criativo e ofereça opções de como expressar de maneira saudável todas as emoções, incluindo raiva, tristeza, frustração

· Evite dizer “não precisa chorar" e as outras frases danosas, mas converse sobre o motivo de a criança estar chorando

· Na hora da birra, não castigue, mas mostre que entende a frustração do pequeno, ouça-o e então ensine uma maneira melhor de fazê-lo

· Assista a filmes e leia livros que tratam de sentimentos e emoções, criando oportunidade para falar sobre eles depois e tirar aprendizados para todos.


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